Irina ficava ali várias vezes por semana, à porta do shopping, no chão, com um copinho à frente. Era de plástico, daqueles onde se servem os gelados. Mas não era para comer gelados que ela precisava do copo.
Em reunião do grupo (eram mais que muitos, mais do que necessários), o companheiro havia reclamado o spot como dele, e ai de quem se atrevesse a retirar-lhe aquele lugar privilegiado para recolher algumas esmolas.
E, à vez, com Jorge a revezá-la, ficava ali, cabeça baixa, da vergonha, do embaraço e do cansaço... a ver se caia alguma moeda. Talvez desse para a carcaça, talvez desse para a bebida.
Os transeuntes, alguns de mãos vazias, outros carregados de sacos, passavam, desviavam o caminho e o olhar e seguiam. Entravam e saíam, iam e vinham...
Irina esperava... às vezes, pedia a ajuda. Outras olhava os carros a passar na rotunda sem destino no olhar.
Como que do nada, ouviu uma voz, tão próxima que lhe pareceu irreal:
"- Então e é aqui que se põe isto? No meio do caminho? Sujeita uma pessoa a cair!"- Irina não respondeu, ainda processava o que ouvia. A velhota, já com alguma dificuldade em andar, de saia azul escura e camisa às flores pequenas em azul e branco, pérolas nas orelhas caídas pela força da gravidade, continuava:
" Vá, chegue lá isso mais para dentro, para ver se não tropeço!"
E com lado de fora do pé, arrastou o copinho para mais próximo de Irina.
Pronto. Assim já não incomodava ninguém.
PS: Qualquer semelhança com a realidade, NÃO é pura ficção. Verdade de quem assistiu a esta cena, há dias à porta do shopping de Santarém (demais pormenores como nomes, etc. ficcionados, obviamente)
Verdade: há pessoas assim.
Sem comentários:
Enviar um comentário